Projeto prevê a construção de dois centros de dados
André Borges escreve para o "Valor Econômico":
O cofre da Biblioteca Nacional (BN) do Rio de Janeiro, lugar onde
estão guardadas as principais raridades da memória nacional, já não tem mais
espaço para um incômodo equipamento que, de uns tempo para cá, passou a
entulhar a disputada sala de segurança. Nas prateleiras, estão empilhados
mais de 200 discos rígidos (HDs), o componente de computador usado para
armazenar os dados digitais.
O alojamento de luxo não foi uma exigência despropositada do pessoal
de informática, explica Angela Monteiro Bettencourt, coordenadora de
informação bibliográfica da BN. Naqueles discos, diz Angela, estão guardadas
cópias de obras raras, como a "Coleção D. Thereza Christina Maria", o
conjunto de 23 mil fotos que fazia parte da biblioteca particular do
imperador D. Pedro II.
Iniciado em 2003, o projeto de digitalização de obras é uma das
iniciativas mais ambiciosas da BN, hoje a sétima maior biblioteca do mundo.
A evolução dessa empreitada, porém, passa agora por uma etapa de
reorganização.
A biblioteca ainda não conta com um "data center", o centro de dados
usado para armazenar, de forma segura, o conteúdo que seu laboratório
digital tem gerado. Hoje, tudo é gravado em computadores comuns, que depois
têm seus HDs retirados e guardados no cofre. O problema é que esse conteúdo
não pára de crescer.
Atualmente, a Biblioteca Nacional Digital reúne 1 milhão de imagens
digitalizadas, o que equivale a 5 terabytes de informação. "Um mapa
digitalizado que colocamos no site tem apenas 70 kilobytes de tamanho, só
que esse mesmo arquivo guardado em alta resolução tem cerca de 300
megabytes."
A montagem do centro de dados é o próximo passo da BN. A instituição
já elaborou uma proposta e a entregou para o Fundo Nacional de Cultura
(FNC), controlado pelo Ministério da Cultura. No ano passado, a verba da
instituição foi de cerca de R$ 330 mil.
O plano da instituição é ter dois centros de dados, um deles para
cópias de segurança. Cada estrutura foi avaliada em cerca de R$ 400 mil.
"Com esse data center, teríamos capacidade suficiente para mais 5 anos de
trabalho."
Por enquanto, a maior parte dos documentos digitalizados pela
biblioteca é constituída de fotos e gravuras raras. De livros, apenas 250
obras passaram pelo processo porque a entidade não conta com um scanner
profissional dedicado especificamente a essa tarefa. O equipamento, que
custa cerca de US$ 120 mil, também está no pacote proposto.
O objetivo é criar o que Muniz Sodré, presidente da Fundação
Biblioteca Nacional, chama de "repositório da memória digital brasileira".
Paralelamente, a BN também faz parte do programa da Unesco, que trabalha na
criação de uma grande biblioteca mundial, disponível via internet. Por
enquanto, diz Sodré, a iniciativa - lançada pela Biblioteca do Congresso dos
EUA em 2005 - só está disponível para a Biblioteca de Alexandria, no Egito.
"Daqui a seis meses, todo o conteúdo estará disponível internacionalmente."
Em 2006, a BN chegou a ser procurada pelo Google, que estava
interessado em digitalizar seu acervo. A parceria, no entanto, não foi
formalizada, e a instituição decidiu tocar seus projetos por conta própria.
"Eles queriam que nós assumíssemos uma série de questões ligadas à
propriedade intelectual; achei melhor descartar a proposta", afirma Sodré.
Segundo Rodrigo Velloso, diretor de desenvolvimento de negócios do
Google, o que atrapalhou as negociações "foram questões políticas, e não de
ordem legal".
O programa "Google Books Search" funciona como uma central de busca de
livros digitais. Obras protegidas por direitos autorais são exibidos
parcialmente, conforme acordo fechado com editoras e autores. Atualmente, o
Google tem parceria com 29 bibliotecas de grande porte no mundo. Nenhuma
delas está na América Latina. "Nosso critério de escolha é o tamanho do
acervo. A Biblioteca Nacional seria a única da região que justificaria
montar uma estrutura local de digitalização de conteúdo", diz Velloso.
Nas estantes da BN há mais de 9,5 milhões de itens, dos quais 1,7
milhão são livros e 200 mil obras de domínio público, cujos autores já
faleceram há mais de 70 anos. Entre as raridades estão 19 edições do
periódico "O Espelho", que trazem textos diversos de Machado de Assis,
publicados em 1859. A partir da próxima semana, o material poderá ser lido
pela internet, no site da BN. E o usuário poderá, inclusive, fazer buscas
por palavras.
(Valor Econômico, 3/10)
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