quarta-feira, 12 de setembro de 2012

IIMIGRAÇÃO GERMÂNICA EM JUIZ DE FORA - MG

A história desconhecida da imigração germânica
Juiz de Fora - MG

Cidade / por Iracema Martins / em 31 de agosto de 2012 às 17:30 /
Imigrantes alemães e austríacos

A Juiz de Fora que os 1.193 imigrantes alemães e austríacos encontraram em 1858 é muito diferente da que conhecemos hoje. Com cerca de 700 habitantes, Santo Antônio do Paraibuna tinha sido elevada a categoria de cidade oito anos antes, em 1850, e se limitava ao que hoje é Avenida Rio Branco, a partir da Rua São Sebastião, até o Bairro Alto dos Passos.]
 
 
 
Imigrantes alemães e autríacos
Instituto Teuto-Brasileiro Willian Dilly

Com o fim das guerras Napoleônicas na Europa, o desemprego atingiu níveis exorbitantes, já que vários países europeus viviam em função das guerras. Enquanto isso, do outro lado do Atlântico, a demanda por mão de obra estrangeira (e barata) crescia. Foi nessas condições que Mariano Procópio, jovem engenheiro, após uma viagem a Inglaterra para conhecer técnicas de construção de estrada, voltou ao Brasil com a ideia de construir a primeira estrada pavimentada da América Latina. Com a ajuda do Imperador D. Pedro II e do perfil agrícola da região, produtora e principal centro de escoamento do café para o Rio de Janeiro, Mariano Procópio fundou a Companhia União Indústria e contratou mão de obra alemã. Os imigrantes que deveriam chegar aos poucos, “invadiram” a cidade quase que de uma vez só, em um pequeno espaço de três meses.

Não foi uma viagem fácil até o Brasil. Distribuídos em cinco veleiros, a maioria dos colonos nunca tinha sequer visto o mar. Foram 76 dias de viagem de Hamburgo até o Rio de Janeiro. Os imigrantes vinham de várias regiões, principalmente do Hessen, região central da Alemanha e do Tirol, região oeste da Áustria. Cerca de 10% morreram durante a viagem ou após a chegada ao Brasil, em sua grande maioria crianças.

Alojados em um primeiro momento em galpões na atual Avenida dos Andradas, local onde havia um lago, com água imprópria para consumo, houve uma epidemia de tifo, chamada pelos colonos de “febre do Brasil”. Mais tarde foram transferidos para as terras compradas por Mariano Procópio anos antes, que compreendiam a região onde hoje estão os Bairros São Pedro, Borboleta, Fábrica até o Francisco Bernardino. Foi então que surgiu a Colônia Agrícola D. Pedro II, tendo como principais redutos germânicos as colônias São Pedro e Borboleta.

Com uma terra inapropriada para a agricultura, os colonos foram contratados pela Companhia União Indústria. Praticamente todos os imigrantes possuíam profissões técnicas como mecânicos, marceneiros, borracheiros, pintores, fabricantes de carruagem, entre outros. Com o fim da construção da estrada União Indústria, foram eles que começaram a mudar o perfil da cidade, de produtora de café para industrial.

Constituindo pequenas manufaturas a vapor, os colonos foram se unindo. Durante mais de 50 anos, os imigrantes foram reconhecidos como os grandes precursores do progresso em Juiz de Fora. Em 1912, por exemplo, haviam nove cervejarias na cidade que, inclusive, exportavam a bebida produzida aqui.

Com a 1ª Guerra Mundial o cenário mudou completamente. Campanhas contra os imigrantes foram iniciadas, alguns tiveram os seus estabelecimentos apedrejados, outros foram presos para averiguação. A língua alemã foi banida das escolas, algumas famílias mudaram o sobrenome, muitos documentos foram destruídos. Com o término da guerra, as famílias começaram a se recuperar, mas com a ascensão do nazismo e a 2ª Guerra Mundial, a cultura germânica praticamente morreu na cidade.

Foi assim que, em 1967, nasceu o Centro Folclórico Teuto-Brasileiro no bairro Borboleta, com a função de recuperar a memória, através da preservação da culinária e das danças. Foi o Teuto-Brasileiro que organizou a primeira “Deutsches Fest”, a Festa Alemã, realizada ano mesmo bairro. Porém, em 1991, houve uma grande briga entre o grupo de dança e a diretoria, criando duas associações distintas: a Associação Cultural e Recreativa Brasil – Alemanha, que ficou responsável pela a organização da festa a partir de 1992 até os dias de hoje; e o Instituto Teuto-Brasileiro William Dilly, que possui um acervo de 4.000 fotos, documentos originais, mapas e relíquias familiares.

Torre da igreja
“Lá eu escondi um monte de documentos dos alemães na guerra. Tá tudo escondido lá”

Roberto Dilly, historiador e presidente do Teuto-Brasileiro, dedica anos da sua vida as pesquisas sobre a imigração germânica. Ainda na adolescência, conheceu Luiz José Steling, autor do livro “Juiz de Fora, a Estrada União Industria e os Alemães”, que tinha como maior ambição descobrir o nome de todos os imigrantes que vieram para a cidade. Steling morreu sem realizar o seu sonho, mas Roberto continuou a pesquisar. Ele passou 15 anos indo, quase que semanalmente, a Igreja da Glória – construída pelos imigrantes – para analisar documentos como certidão de nascimento, de casamento e de óbito.

Em 15 anos, cruzando informações, ele descobriu 300 nomes. Até que em 1980, em uma tarde que Roberto se emociona ao falar ainda hoje, um padre senil, vestindo pijamas, entrou correndo pela pequena sala onde ele pesquisava. Percebendo as anotações, o padre Juquinha perguntou se Roberto estava fazendo o dever de casa. “Não, eu estou escrevendo sobre os alemães”, respondeu ele. Então, em um momento único de lucidez, o padre Juquinha disse: “Os alemães? Sabe a torre da igreja, onde ta o sino? Lá eu escondi um monte de documentos dos alemães na guerra. Ta tudo escondido lá”.
 
 


Livro de registro dos cinco veleiros que trouxeram os imigrantes
Foto: Tereza Martins

Roberto Dilly teve que insistir muito com o padre Jaime Machado Zimmerman para conseguir autorização para subir na torre da igreja. Lutando contra o seu medo de altura, Roberto achou escondido embaixo da janela no alto da torre documentos originais, escritos em alemão, a grande maioria destruída pela chuva. Entre esses papeis estava um embrulho, enrolado em jornais e cheio de lodo. Lá dentro estava, intacto, o livro com o registro dos cinco veleiros – Tell, Rhein, Gundela, Gessner e o Osnabruck – com todos os 1.193 passageiros com nome, sobrenome, idade, cidade de origem, estado, profissão para a qual tinha sido contratado, profissão anterior, quantas pessoas da família estavam juntas, seguido do nome da esposa e dos filhos, em ordem decrescente. Nesse livro foi que Roberto fez uma das grandes descobertas, a presença de austríacos na imigração. Até então, acreditava-se que apenas alemães tinham vindo para Juiz de Fora.

Memória

“Nativa” do São Pedro, como gosta de se chamar, Maria da Glória Dilly Schuchter, de 87 anos, faz parte dos 80 mil descendentes germânicos que vivem atualmente em Juiz de Fora.
 
 
 
 
D. Glória e alguns de seus 24 netos
Foto: Tereza Martins

A bisavó de Dona Glória casou-se na Alemanha e embarcou para o Brasil em um dos cinco veleiros. Chegando a Juiz de Fora, comprou terras na Colônia D. Pedro II. Posteriormente, as terras foram sendo dividas para os filhos.

Em um bairro habitado quase que exclusivamente por descendentes germânicos, Dona Glória conheceu seu marido, já falecido, de família austríaca, José Lourenço Schuchter, que hoje dá nome a rua onde ela mora no bairro. Eles se casaram quando ela tinha 21 anos e juntos tiveram dez filhos.


Com uma memória invejável, Dona Glória guarda muitas lembranças da época de infância. Durante algum tempo ela estudou no Colégio Santa Catarina, no Morro da Glória. Ela saía às 8h da manhã de casa e ia a pé até o colégio, sem não antes deixar o almoço para o pai que trabalhava nas redondezas. Dona Glória é a mais velha de oito irmãos e desde muito cedo sempre ajudou a mãe.

De geração em geração

A médica veterinária Melina de Castro Schuchter, 28, uma dos 24 netos de Dona Glória, pouco sabia sobre a origem de sua família. A curiosidade surgiu através de um amigo, também descendente germânico, que lhe contou sobre os trabalhos do Instituto Teuto-Brasileiro.

Indagada sobre a importância de conhecer a história da família, ela disse: “Acho muito importante manter viva a história da imigração germânica em Juiz de fora, visto que o impacto causado por esse fato foi muito grande e eu não fazia ideia disso até visitar o Instituto. Foi muito emocionante ver fotografias de meus antepassados, ouvir histórias e imaginar que meu tataravô saiu da Europa em um navio há muitos anos atrás, enfrentou o desconhecido, o medo e o mar para fazer a vida aqui em nosso país. Isso de alguma forma influencia em quem eu sou. “
 
 
 
fonte: www.cbg.org.br 

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